quinta-feira, 11 de junho de 2009

Lacrimosa

Lacrimosa dies illa,
Qua resurget ex favilla.
Judicandus homo reus:
Huic ergo parce, Deus.
Pie Jesu Domine,
Dona eis requiem. Amen.

Piaf

...

... Et dès que je l'apercois
Alors je sens en moi
Mon coeur qui bat ...

(La Vie En Rose)

...

Saudades - Casimiro de abreu

Nas horas mortas da noite
Como é doce o meditar
Quando as estrelas cintilam
Nas ondas quietas do mar;
Quando a lua majestosa
Surgindo linda e formosa,
Como donzela vaidosa
Nas águas se vai mirar!

Nessas horas de silêncio,
De tristezas e de amor,
Eu gosto de ouvir ao longe,
Cheio de mágoa e de dor,
O sino do campanário
Que fala tão solitário
Com esse som mortuário
Que nos enche de pavor.

Então — proscrito e sozinho —
Eu solto aos ecos da serra
Suspiros dessa saudade
Que no meu peito se encerra.
Esses prantos de amargores
São prantos cheios de dores:
— Saudades — dos meus amores,
— Saudades — da minha terra !

No lar - Casimiro de abreu

Terra da minha pátria, abre-me o seio

Na morte — ao menos........

Garrett

I

Longe da pátria, sob um céu diverso
Onde o sol como aqui tanto não arde,
Chorei saudades do meu lar querido
— Ave sem ninho que suspira à tarde. —

No mar — de noite — solitário e triste
Fitando os lumes que no céu tremiam,
Ávido e louco nos meus sonhos d’alma
Folguei nos campos que meus olhos viam.

Era pátria e família e vida e tudo,
Glória, amores, mocidade e crença,
E, todo em choros, vim beijar as praias
Porque chorara nessa longa ausência.

Eis-me na pátria, no país das flores,
— O filho pródigo a seus lares volve,
E concertando as suas vestes rotas,
O seu passado com prazer revolve! —

Eis meu lar, minha casa, meus amores,
A terra onde nasci, meu teto amigo,
A gruta, a sombra, a solidão, o rio
Onde o amor me nasceu — cresceu comigo.

Os mesmos campos que eu deixei criança,
Árvores novas... tanta flor no prado!...
Oh! como és linda, minha terra d’alma,
— Noiva enfeitada para o seu noivado! —

Foi aqui, foi ali, além... mais longe,
Que eu sentei-me a chorar no fim do dia;
— Lá vejo o atalho que vai dar na várzea...
Lá o barranco por onde eu subia!...

Acho agora mais seca a cachoeira
Onde banhei-me no infantil cansaço...
— Como está velho o laranjal tamanho
Onde eu caçava o sanhaçu a laço!...

Como eu me lembro dos meus dias puros!
Nada m’esquece!... e esquecer quem há de?...
— Cada pedra que eu palpo, ou tronco, ou folha,
Fala-me ainda dessa doce idade!

Eu me remoço recordando a infância,
E tanto a vida me palpita agora
Que eu dera oh! Deus! a mocidade inteira
Por um só dia do viver d’outrora!

E a casa?... as salas, estes móveis... tudo,
O crucifixo pendurado ao muro...
O quarto do oratório... a sala grande
Onde eu temia penetrar no escuro!...

E ali... naquele canto... o berço armado
E minha mana, tão gentil, dormindo!
E mamãe a contar-me histórias lindas
Quando eu chorava e a beijava rindo!

Oh! primavera! oh! minha mãe querida
Oh! mana! — anjinho que eu amei com ânsia —
Vinde ver-me, em soluços — de joelhos —
Beijando em choros este pó da infância!

II

Meu Deus! eu chorei tanto lá no exílio!
Tanta dor me cortou a voz sentida,
Que agora neste gozo de proscrito
Chora minh’alma e me sucumbe a vida!

Quero amor! quero vida! e longa e bela
Que eu, Senhor! não vivi — dormi apenas!
Minh’alma que s’expande e se entumece
Despe o seu luto nas canções amenas.

Que sede que eu sentia nessas noites!
Quanto beijo roçou-me os lábios quentes!
E, pálido, acordava no meu leito
— Sozinho — e órfão das visões ardentes!

Quero amor! quero vida! aqui, na sombra,
No silêncio e na voz desta natura;
— Da primavera de minh’alma os cantos
Caso co’as flores da estação mais pura.

Quero amor! quero vida! os lábios ardem.
Preciso as dores dum sentir profundo!
— Sôfrego a taça esgotarei dum trago
Embora a morte vá topar no fundo.

Quero amor! quero vida! Um rosto virgem,
— Alma de arcanjo que me fale amores,
Que ria e chore, que suspire e gema
E doure a vida sobre um chão de flores.

Quero amor! quero amor! — Uns dedos brancos
Que passem a brincar nos meus cabelos;
Rosto lindo de fada vaporosa
Que dê-me vida e que me mate em zelos!

— Oh! céu de minha terra — azul sem mancha —
Oh! sol de fogo que me queima a fronte,
Nuvens douradas que correis no ocaso,
Névoas da tarde que cobris o monte;

Perfumes da floresta, vozes doces,
Mansa lagoa que o luar prateia,
Claros riachos, cachoeiras altas,
Ondas tranqüilas que morreis na areia;

Aves dos bosques, brisas das montanhas,
Bem-te-vis do campo, sabiás da praia,
— Cantai, correi, brilhai — minh’alma em ânsias
Treme de gozo e de prazer desmaia!

Flores, perfumes, solidões, gorjeios,
Amor, ternura — modulai-me a lira!
— Seja um poema este ferver de idéias
Que a mente cala e o coração suspira.

Oh! mocidade! bem te sinto e vejo!
De amor e vida me trasborda o peito...
— Basta-me um ano!... e depois... na sombra...
Onde tive o berço quero ter meu leito!

Eu canto, eu choro, eu rio, e grato e louco
Nos pobres hinos te bendigo, oh! Deus!
Deste-me os gozos do meu lar querido...
Bendito sejas! — vou viver c’os meus!